Prefeitura publica edital de concessão de lote de parques contendo o Ibirapuera

Justiça libera Ibirapuera para a iniciativa privada mas polêmica continua

No final do mês passado, em 30/10, um dos empreendimentos públicos mais emblemáticos da história recente de São Paulo, o Parque do Ibirapuera, foi entregue à iniciativa privada após decisão judicial. Embora a empreiteira Construcap já houvesse ganho a licitação em março, uma decisão final sobre sua vitória ficou pendente da elaboração e aprovação de um plano diretor para a gestão privada, atendendo contestações sobre falta de garantias quanto à continuidade dos serviços socioambientais hoje oferecidos. O plano está agora concluído e acaba de ser aprovado pela justiça, mas sua aceitação pelo atores do processo foi somente parcial, o que deverá manter a polêmica acesa.

Em março empreiteira arrematou o Ibirapuera por R$ 70 milhões mas não levou

A imprensa informou no dia 12/3/19 que a empreiteira Construcap havia arrematado por R$ 70,5 milhões direitos para explorar comercialmente o Parque do Ibirapuera por 35 anos, dando destaque para o fato da empresa ser investigada na Lava Jato. O jornal Metro, por exemplo, noticiou que

Investigada na operação Lava Jato, a construtora Construcap venceu a licitação de concessão do parque Ibirapuera (zona sul) com uma proposta de R$ 70,5 milhões para administrar a área verde pelos próximos 35 anos. Os envelopes com as ofertas foram abertos ontem pela Prefeitura de São Paulo.

No total, como contrapartida, a empreiteira também assumiu a administração de outros cinco parques da periferia:

  • Jacintho Alberto, na Zona Norte;
  • Tenente Faria Lima, na Zona Norte;
  • Jardim Felicidade,a Zona Oeste;
  • Eucaliptos, na Zona Oeste;
  • Lajeado, na Zona Leste

Contestação por falta de plano diretor

A falta de regras claras para garantir a preservação da fauna e flora do Parque, e ainda que os retornos comerciais do gestor privado não colocassem em risco o espaço socioambiental público e gratuito, acabou sendo um entrave à entrega imediata para a iniciativa privada. Em decorrência, a justiça, atendendo a questionamentos levantados pelo Ministério Público e pelo vereador Gilberto Natalini, determinou, antes da abertura dos envelopes em 11/03 , que um plano diretor para a gestão do Parque, com participação do Ministério Público e do vereador, e ainda submetido a audiências públicas, deveria ser elaborado e apresentado no prazo máximo de seis meses para que decidisse sobre a entrega definitiva para a concessionária, como já publicado aqui no site:

Vencedor deverá aceitar plano diretor a ser elaborado em seis meses

Este foi o acordo fechado entre o Executivo Municipal e o Ministério Público do Estado, juntamente com o vereador Gilberto Natalini, que haviam suspendido o processo de licitação. O plano deverá corrigir o edital para ajustar questões envolvendo meio ambiente, gestão participativa, impactos sociais e urbanísticos. Caso a empresa vencedora não concorde, será chamada a segunda colocada, e caso esta também não concorde, será marcada nova licitação.

=> Ibirapuera: envelopes da licitação deverão ser abertos na segunda sob condição

Estado poderá ter que continuar a arcar com principais gastos: segurança e manutenção dos lagos

Uma outra questão levantada foi a de que, de maneira a garantir o retorno econômico da concessionária, os principais gastos do Parque continuariam sob responsabilidade do estado. Quem levantou o problema foi a ONG Parque Ibirapuera Conservação:

A segurança do parque, tão controvertida e justamente considerada insuficiente por muitos frequentadores, não entra no pacote. Continua sendo responsabilidade econômica da Prefeitura de São Paulo. Pena que exatamente a segurança consome a maior parte do orçamento e dos gastos com o parque pelos cofres públicos…

Outra questão que causa perplexidade são os lagos. No edital, à eventual concessionária pede-se somente que monitore a cada três meses a qualidade da água e que a comunique à Prefeitura, que continua sendo a encarregada dos procedimentos de saneamento e da limpeza dos lagos.

=> Privatização do Ibirapuera: “nebulosidade e lacunas”

Juíza libera privatização apesar de questionamentos lembrando que haverá revisão em 5 anos

Segundo o portal G1,

[…] Após a apresentação do documento, o MP considerou que as alterações realizadas pela Secretaria do Verde atendiam ao que foi solicitado, já Natalini afirmou que o processo foi marcado por indícios de fraude por parte da empresa Construcap e rejeitou o acordo. (Leia mais abaixo)

Na decisão desta quarta-feira [30/10], a juíza Cynthia Thomé considerou que os argumentos apresentados pelo vereador “não têm o condão de desqualificar o Plano Diretor apresentado”. Natalini afirmou que vai recorrer da decisão.

“Não há dúvida que o Plano Diretor apresentado não é perfeito, e dificilmente seria. Contudo, tutela os interesses socioambientais, e ainda, poderá ser aperfeiçoado em cinco anos, por ocasião de sua revisão”, afirma a magistrada na decisão.

A juíza afirmou ainda que a concessão do parque não legitima o concessionário a atuar da maneira como bem entender. E que é dever dos cidadãos, do Ministério Público e do Conselho Gestor atuar na fiscalização

=> Justiça de São Paulo libera concessão do Parque Ibirapuera à iniciativa privada (G1 30/10/19)

Polêmica permanece

Apesar de ser citado como exemplo modelo do Central Park não se aplica

O modelo do Central Park de Nova York, usado por João Doria como exemplo de privatização exitosa, na realidade é bem diferente do que acabou sendo implementado. No caso do Central Park, o que se deu na realidade não foi uma privatização com finalidade de lucro, mas sim a criação de uma fundação com recursos privados, mas sem fins lucrativos, que se encarrega da manutenção e restauro em parceria com a prefeitura.

Ainda em 2016 a professora Raquel Rolnik, da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP, mostrou claramente esta diferença em sua coluna na Rádio USP (Colunista comenta proposta de privatização do Ibirapuera – Jornal da USP 13/10/2016).

Ministério Público aprova plano, mas Natalini não

Sempre de acordo com o G1,

[…]”Fui contra o plano diretor”, disse Natalini. Ele argumenta que as audiências públicas que discutiram o plano tinham funcionários da Construcap na plateia e que os potenciais de geração de receita previstos na proposta tinham aumento ano a ano, mas sem justificativa adequada para isso. “Vou recorrer desta decisão ao Tribunal de Justiça”, complementou.

[…] Outro ponto questionado pelo vereador Natalini no parecer é a receita anual do parque que passaria, em dois anos, de R$ 2 milhões para R$ 178,6 milhões. “O que justificaria uma entrada de recursos quase 90 vezes maior? Não há explicações a respeito. Nem garantias de que serão mantidos os serviços ambientais, o motivo inicial da Ação Popular. Aceitou-se o acordo judicial, mas, na prática, mesmo com o PD pronto, ainda é desconhecido o que será do futuro do Parque”, diz o texto.

=> Justiça de São Paulo libera concessão do Parque Ibirapuera à iniciativa privada (G1 30/10/19)

 => A inauguração mais festejada da história da cidade <=

O Parque foi idealizado em 1926, e um primeiro projeto foi aprovado em plena revolução constitucionalista de 1932. Mas foi em 1951, já durante os preparativos para a comemoração dos 400 anos da cidade, que foram tomadas as medidas decisivas para que fosse inaugurado em agosto de 1954, como centro dos principais eventos comemorativos do seu quarto centenário, desbancando Interlagos, a Cidade Universitária e a Marginal Pinheiros.

As novas instalações  do “Mais Moderno Logradouro Público do Mundo” foram inauguradas no dia 21 de agosto de 1954, um sábado, juntamente com a Exposição do IV Centenário, às 11 horas. Como publicaram o Estado e a Folha da Manhã do mesmo dia, em meio a “apitos de todas as fábricas e repiques de sinos de todas as igrejas”, e inúmeros outros eventos políticos, religiosos e culturais que tomaram todo o sábado e o domingo, no que tenha sido possivelmente o mais festejado acontecimento da história da cidade.