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Lei libera anistia para até 750 mil imóveis irregulares em SP

Lei libera anistia para até 750 mil imóveis irregulares em SP; para 600 mil de forma automática

A prefeitura de São Paulo informa que foi sancionada a chamada ” Lei de Anistia” (lei nº 17.202/2019), que beneficiará cerca de 750.000 proprietários de imóveis irregulares construídos até 2014.

Segundo o site da prefeitura,

O prefeito Bruno Covas sancionou nesta quarta-feira (16/10) a Lei de Regularização de Edificações, que popularmente ficou conhecida como “Lei de Anistia”. A partir de agora, todos os munícipes que apresentam algum tipo de irregularidade em seus imóveis construídos até julho de 2014 e se enquadram nas regras da lei, poderão se regularizar e se adequar às normas da Prefeitura.

[…] O objetivo do município é conceder à população a garantia sobre seu imóvel – residencial ou comercial –, permitindo seu financiamento, transferência, aluguel ou venda de forma regular. Além de desburocratizar e simplificar a vida da população e de quem empreende e contribui para o desenvolvimento econômico da cidade.

“O processo é mais simples e menos burocrático. Esse sistema de regularização será semelhante ao do imposto de renda. O interessado vai entrar no portal de licenciamento da cidade, preencher os campos solicitando a sua regularização e o próprio sistema vai aprovando as informações caso elas estejam de acordo com a legislação municipal”, destacou o secretário de Licenciamento, Cesar Angel Boffa de Azevedo.

No entanto, existem casos em que a regularização não se aplica: imóveis situados em logradouros ou terrenos públicos; loteamentos irregulares; construções junto à represas, lagos, córregos, áreas de preservação ambiental, galerias e linhas de energia de alta tensão; perímetro de Operações Urbanas e edificações que ultrapassem o limite máximo de construção previsto na antiga Lei de Zoneamento (Lei n° 13.885/04).

Para os casos em que a construção tenha ultrapassado o potencial construtivo autorizado pela Prefeitura, sem que tenha ocorrido a devida oficialização do município, haverá um acréscimo de 20% ao valor cobrado pela outorga onerosa – contrapartida financeira paga por construções acima da metragem básica permitida para o lote. Esse acréscimo está previsto na lei como “Fator de Regularização” e será um ponto de equilíbrio para o ressarcimento da municipalidade em virtude da construção irregular.

O valor arrecadado nesses casos será repassado ao Fundo Municipal de Desenvolvimento Urbano (FUNDURB) e utilizado para implantação de obras públicas e melhorias em toda a cidade, em áreas como habitação, cultura, áreas verdes, transportes ou calçadas.

A lei entra em vigor a partir de 01/01/2020.

Três modalidades de regularização

Ainda de acordo com a prefeitura,

Para dar agilidade aos processos, foram estabelecidas três modalidades de regularização, que levam em conta a complexidade da edificação: regularização automática, regularização declaratória e regularização comum.

Regularização Automática

Como o próprio nome diz, a regularização automática, acontecerá sem necessidade de solicitação por parte do munícipe. Será voltada a residências unifamiliares de baixo e médio padrão, isto é, casas simples ou conjuntos de casas com valor venal igual ou inferior a R$ 160 mil e que contavam com isenção total no cadastro de IPTU de 2014. São os casos de aposentados e pensionistas, com rendimento mensal inferior a três salários mínimos, que não possuam outro imóvel.

Todavia, além dos fatores que impedem a regularização de qualquer edificação, não poderão ser regularizados automaticamente imóveis em áreas tombadas ou envoltórias e em áreas de proteção de mananciais, ambientais ou de preservação permanente, ou que não atendam as condições descritas na Lei de Zoneamento de 2004.

A Prefeitura possui o prazo de 1 ano para a disponibilização do comprovante de regularização do imóvel, a ser emitido via Portal do Licenciamento.

Regularização Declaratória

A regularização declaratória será aplicada em edificações com área total construída de até 1.500 m2. Entram nessa categoria as residências não contempladas pela modalidade automática, os imóveis residenciais verticais e horizontais com até 10 m de altura e 20 apartamentos, os prédios viabilizados pelo poder público destinados à Habitação de Interesse Social (famílias com renda mensal entre 0 e 6 salários mínimos) e à Habitação de Mercado Popular (famílias com renda mensal entre 6 e 10 salários mínimos), locais de culto, edifícios de uso misto (residencial e comercial, por exemplo) e comércios ou serviços considerados de baixo risco, como escolas, escritórios, padarias, mercados e salões de beleza.

Para estes casos, o cidadão deverá protocolar, de maneira eletrônica, o formulário de regularização, juntamente com os documentos exigidos, como matrícula do imóvel, e peças gráficas assinadas por um profissional habilitado, o que atestará a veracidade das informações apresentadas à Prefeitura e o atendimento às condições de segurança necessárias. Neste caso, o imóvel só poderá ser regularizado após análise e decisão do Município.

Regularização Comum

A modalidade de regularização comum destina-se às demais edificações não contempladas nas categorias anteriores e que possuam área superior a 1.500 m2.

A certificação é emitida a partir da apresentação de documentos assinados por um profissional habilitado e posterior análise da Prefeitura. Assim como na modalidade “declaratória”, todo o processo será realizado de forma eletrônica. Shoppings e faculdades são alguns exemplos dos tipos de estabelecimento que serão regularizados pela via comum.

[…] A Prefeitura estima que a proposta da Lei de Regularização alcance até 600 mil imóveis irregulares na modalidade automática e outros 150 mil nas modalidades comum e declaratória.

Mais informações: http://meuimovelregular.prefeitura.sp.gov.br/

=> Prefeito sanciona Lei de Regularização de Edificações na capital paulista (PMSP 16/10/19)

 

Reações

Diferentes especialistas do setor, de acordo com o Terra, manifestaram uma visão bastante crítica em relação à lei. Seus principais argumentos dizem respeito ao caráter paliativo da medida, uma vez que ataca consequências e não causas, ao possível incentivo à construção irregular, ao risco de acidentes devido à ausência de fiscalização in loco, e à falta de participação.

Especialistas dizem que medida é ‘paliativo’

Para especialistas e o Sindicato da Construção, a anistia agora funciona quase como um “paliativo”. “Pela quantidade de imóveis irregulares ou a gente não tem como fiscalizar ou as regras não estão de acordo com o crescimento da cidade”, diz Cláudio Bernardes, presidente do Conselho Consultivo do Secovi. “Com a anistia, a cidade trata dos sintomas com remédio, mas não atinge a cura – é preciso que a gente entenda e estude porque existem tantos imóveis irregulares em São Paulo. Temos de atacar as causas.”

Anistia pode servir de incentivo à construção irregular

Segundo o professor Márcio Coelho, da Faap, “existe também uma questão educacional”. “A anistia não pode servir como incentivo à construção irregular. Esse processo de regularização precisa estar acompanhado de uma campanha educacional – para que a população entenda os riscos de não ter um imóvel dentro das especificações técnicas. É preciso ficar claro que não é anistia geral e irrestrita.”

Falta de fiscalização prévia aumenta risco de acidentes

Questionado sobre a o possível aumento do risco de acidentes devido à ausência de fiscalização prévia in loco nos procedimentos pevistos na lei, o prefeito demonstrou irritação, afirmando que a gestão municipal buscava “uma relação de confiança com a população”:

Questionado mais de uma vez sobre quais garantias a gestão municipal tem de que os imóveis que passaram por obras estão em segurança e se haveria fiscalização nesses locais, Covas, visivelmente irritado, disse que a gestão municipal busca uma relação de confiança com a população.

Afirmou ainda que, caso notassem falta de segurança, as pessoas “não estariam habitando esses espaços”. Adicionalmente, a lei não contemplaria regiões consideradas como críticas, ou seja, “represas, lagos, córregos e áreas de proteção ambiental, loteamentos irregulares e imóveis em terrenos públicos”:

“A gente precisa parar com essa visão de que o poder público tem de tutelar a vida das pessoas. As pessoas já estão morando nesses locais e, provavelmente, têm tranquilidade de que podem morar lá, se não elas não estariam habitando esses espaços. O poder público tem de acreditar mais nas pessoas, na população. É como se a caneta do funcionário público respeitasse a lei e as pessoas, não. As pessoas também gostam de respeitar a lei e essa é a relação que o poder público tem de ter com as pessoas.”

A regularização não vai contemplar construções junto a represas, lagos, córregos e áreas de proteção ambiental, loteamentos irregulares e imóveis em terrenos públicos.

No entanto, existem controvérsias:

[…] Lucio Gomes Machado, arquiteto e professor aposentado da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAU-USP), diz que a Prefeitura deveria fiscalizar os imóveis que serão anistiados automaticamente. “Isso é ruim para a cidade, porque ela já está sendo construída de forma ineficiente do ponto de vista urbanístico. Há uma quantidade gigantesca de imóveis irregulares tanto de baixa renda quanto de alta renda, e isso é muito grande para ser anistiado sem nenhuma precaução”, observa Machado. “Há risco de acidentes graves como o que vimos no Ceará”, acrescenta ele.

Falta de participação

“As anistias são um puxadinho para legalizar os puxadinhos das casas, são uma consequência de uma distorção estrutural da legislação urbana, prova de que ela é frágil e falha. É fundamental que as anistias reconheçam a cidade real, dando mais voz para as comissões municipais, como a de zoneamento e de políticas urbanas”, afirma Valter Caldana, professor de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Presbiteriana Mackenzie.

=> Prefeitura sanciona lei que anistia até 750 mil imóveis em SP (Terra 16/10/19)